Desculpas de autores...(2)

Perdão, também tenho um autor cuja mãe já deve ter morrido umas três vezes... pelo menos. Mas aí eu deveria desconfiar: porque senão tem talento para inventar boas desculpas, será que tem talento para escrever livros?

Desculpas de autores...

Algumas das desculpas que mais ouço, quando algum autor falha um prazo de entrega: perdi o que tinha escrito, não gravei o documento, gravei por cima, etc, etc, etc.... vou, para além de outras tarefas diárias que tenho, começar a dar cursos de informática aos autores!

Pergunta?

Ainda refletindo sobre as palavras da editora da Tinta da China pergunto: porque é que há editores que olham para os bestsellers como o satanás!? Os livros são feitos para ser lidos, verdade? Ou o critério é: quanto menos vender melhor é o livro?

Perdão?

Bárbara Bulhosa a editora da Tinta-da-China comentando a expansão da editora para o Brasil garante como cartão de apresentação que os livros que edita: «Não são livros direcionados para a massa, não trabalhamos com best-sellers. São livros feitos para pessoas que realmente gostam de ler». E os leitores de bestsellers não gostam de ler? Não têm categoria de leitores? Pergunto...

E se eu proponho uma ideia fantástica para um livro, o autor sai todo entusiasmado da reunião, desaparece durante umas semanas e tal, e depois reaparece, numa qualquer entrevista, a falar do seu novo livro para outra editora que não a minha, isso é.....?

O Quarto de Jack

Durante cinco anos toda a energia, toda a força de uma mãe foi dedicada a educar, entreter e amar o seu filho. Até aqui nada demais. Mas o rapaz, Jack, vive fechado num quarto com a mãe, raptada aos 19 anos, por alguém que a criança, chama de Nick Mafarrico. O mesmo que entra à noite no quarto, enquanto Jack fica fechado no Armário...  

É neste mundo privado do Quarto que entramos pela mão da escritora Emma Donoghue. Assistimos às brincadeiras, participamos nas conversas, vemos Dora a Exploradora na televisão, fazemos ginástica, lemos livros, cantamos Lady Gaga....
Um livro recheado de beleza e esperança!
Devorei O Quarto de Jack em duas noites....mas tenho a certeza que vai ficar comigo durante muito, muito tempo.

- Bom dia eu gostaria de saber se estava interessada num livro de fotografia?
- Mas o tema do livro é qual?
- Não é fácil de explicar, bom eu tenho umas cem fotografias de pessoas, em que o meu objectivo era captar a sua alma....
- Desculpe, não percebi.
- Não percebeu? Na fotografia aparece a sua aura, a alma, os fantasmas dessa pessoa...
- Aparece como assim?
- Aparecem na revelação da fotografia! Sou a única pessoa no mundo a fazer este tipo de imagem...
- Acredito!

- Muito obrigado por me receber, porque eu quero muito publicar o meu livro na sua editora. Acompanho o vosso trabalho e este grande grupo editorial tem feito um trabalho formidável na área dos livros. Têm autores fabulosos, e os livros muito interessantes, o romance X que lançaram recentemente, sabe, li-o em dois dias...
- Que bom, mas acho que se enganou na editora...

- Bom dia, eu gostava de saber como posso enviar um manuscrito para a editora?
- Por e-mail ou por correio, como preferir. E de que trata a sua obra?
- É um livro de poesia.
- Nós não editamos poesia, sendo assim julgo que não vale a pena enviar o texto. Agradeço o seu telefonema...
- Mas, eu também tenho um livro de ensaio...
- De momento também não publicamos ensaio.
- Ah, mas também tenho um romance que estou acabar de escrever e um livro de receitas.... Posso enviar?
- Desculpe?

Qualquer um escreve um livro....

Esta deve ser uma das frases que mais ouço no meu dia-a-dia.
Dito num tom crítico, jocoso, de desprezo. Há sempre uma voz (sabe-se lá quem é que a encarregou dessa tarefa) que se levanta do alto da sua sabedoria para defender o bom nome do livro.
Qualquer um escreve um livro!
E então?
Eu trabalho todos os dias com livros. Sou, o que se chama, uma editora.
Adoro livros! Mas aqueles livros que se lêem, que se sublinham, que se dobram as páginas, se rasgam, se emprestam porque de tão bons que são têm de ser partilhados, que ficam marcados pelas lágrimas ou pelas gargalhadas, que andam aos trambolhões na mala, entre a garrafa de água e os gormitis dos filhos, que se lêem numa noite ou que têm de ser mastigados ao longo de semanas....  
O livro é um objecto de culto? Sim
O livro é um objecto de cultura?  Sim
O livro é um objecto de prazer? Absolutamente!
E se para uns é o prémio Nobel, o número um da lista do New York Times ou do top da Fnac, para outros pode ser o livro da rapariga de coxa grossa que acaba de sair de um qualquer reality show.
Qualquer um escreve um livro. Ainda bem.